Compra e venda de lote em loteamento não registrado: é válida ou nula?
- Jéssica Pin

- 1 de set.
- 4 min de leitura

A compra de lotes em loteamento é algo comum em nossa sociedade, inclusive, em razão de seus valores mais atrativos no mercado imobiliário. Dessa forma, sempre que um desses empreendimentos são lançados, ocorre a venda dos lotes antes mesmo de sua liberação para entrega ao comprador.
Válido dizer que não há qualquer problema nesse sentido desde que, entretanto, algumas regras estabelecidas pela legislação sejam respeitadas. Caso contrário, a venda pode ser considerada nula.
O que a lei fala sobre a venda?
A legislação coloca um marco inicial no qual poderá ocorrer a venda e, caso ocorra em momento anterior, a compra poderá ser considerada nula. Observe o disposto na lei 6766/79 (lei de loteamento):
Art. 37. É vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado.
Veja que o imóvel não poderá ser vendido antes do registro do empreendimento, ou seja, o loteamento deverá cumprir alguns requisitos estabelecidos em cada município e cartório para o registro. Com isso, apenas após conseguir todas as aprovações necessárias para o registro poderá iniciar a venda do imóvel.
ENTENDA MELHOR:
Para melhor compreensão, é importante ressaltar que um contrato válido tem alguns requisitos previstos em lei:
agente capaz (pessoa capaz de realizar uma contratação, seja por sua idade e/ou saúde mental);
objeto lícito, possível, determinado ou determinável (objeto é o que está sendo negociado - neste caso, o lote);
forma prescrita ou não defesa em lei (observar estrutura correta estabelecida em lei).
No caso das vendas de lotes em loteamento sem registro, o requisito não cumprido é o segundo: objeto lícito. Como há determinação em lei exigindo a existência do registro e, da mesma forma, proibindo a venda de lotes desses loteamentos, o objeto (lote) se torna ilícito dentro da negociação.
Muito se discutia dentro do Poder Judiciário sobre a possibilidade de validação do contrato com a anuência do comprador diante da ciência da falta de registro. Contudo, com base justamente nos requisitos de um contrato válido, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que, mesmo com a mencionada ciência, a negociação continuaria nula:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO. COMPRA E VENDA. TERRENO NÃO REGISTRADO . CIENCIA DO ADQUIRENTE. CONTRATO ENTRE PARTICULARES. ILICITUDE DO OBJETO. VEDAÇÃO LEGAL . NEGÓCIO JURÍDICO NULO. 1. Ação declaratória de nulidade de negócio jurídico ajuizada em 14/09/2021, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 22/02/2024 e concluso ao gabinete em 23/08/2024.2 . O propósito recursal é decidir (I) se é válida a venda de lote não registrado se o adquirente estava ciente desta irregularidade no momento da compra e (II) se a Lei 6.766/79 é aplicável a contratos firmados entre particulares.3. Para a aplicabilidade da Lei 6 .766/79 é irrelevante apurar se o loteamento e o desmembramento ostentam o caráter de empreendimento imobiliário, se o vendedor atua como profissional do ramo ou se incide relação consumerista.4. Não tendo o loteador nem requisitado a aprovação do loteamento perante a Prefeitura Municipal e iniciado mesmo assim a urbanização deste, estar-se-á diante do chamado loteamento clandestino ou irregular.5 . O objeto do contrato de compra e venda de terreno não registrado é ilícito, pois a Lei 6.766/79 objetiva exatamente coibir os nefastos efeitos ambientais e sociais do loteamento irregular.6. O art . 37 da Lei 6.766/79 estabelece que é vedado vender ou prometer vender parcela de loteamento ou desmembramento não registrado.7. Tratando-se de nulidade, o fato de o adquirente ter ciência da irregularidade do lote quando da sua aquisição não convalida o negócio, pois, nessas situações, somente se admite o retorno dos contratantes ao "status quo ante" .8. Não tendo o loteador providenciado o registro do imóvel, independentemente de ter sido firmada entre particulares cientes da irregularidade do imóvel, a compra e venda de loteamento não registrado é prática contratual taxativamente vedada por lei e que possui objeto ilícito. Por isso, o negócio jurídico deve ser declarado nulo.9 . Recurso especial conhecido e desprovido, com majoração de honorários. (STJ - REsp: 2166273 SP 2024/0192932-0, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 08/10/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/10/2024).
MAS POR QUE NÃO É POSSÍVEL VALIDAR A VENDA?
Para o registro, há necessidade de cumprimento de requisitos gerais estabelecidas pelo ordenamento jurídico a todos os loteamentos, mas também existem aqueles específicos para cada região.
A intenção é amenizar danos ao município, em especial danos ambientais, com a realização do empreendimento, bem como garantir que a estrutura está adequada e apta para habitação ou utilização comercial pelas pessoas compradoras. Observa-se que a falta de registro ultrapassa os danos que eventualmente a parte compradora sofrerá, já que poderá atingir a coletividade, o meio ambiente e o município como um todo.
Por esse motivo, torna-se irrelevante o conhecimento do comprador do lote quanto à irregularidade, já que a nulidade não vem da falta de vontade ou anuência, mas sim do próprio lote que poderá causar prejuízos à coletividade. Essa ciência se mostra importante apenas em relação a eventual indenização por danos sofridos, mas não sorbre a validação do negócio.
Portanto, ao realizar um empreendimento imobiliário como o loteamento ou, ainda, adquirir um imóvel, torna-se essencial a consultoria especilizada de um advogado atuante em Direito Imobiliário a fim de que os requisitos sejam conferidos e a compra seja segura evitando prejuízos futuros.
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